Pular para o conteúdo principal

Rio Zona Norte - Nelson Pereira dos Santos - 1957

Segundo filme do criador do cinema novo aqui no Brasil. Nele está o personagem das chanchadas, Grande Otelo, interpretando um compositor que vive no morro carioca - um faminto por sucesso e dinheiro, por uma vida decente. Ele compõe músicas belíssimas, tristes, realistas, mas é desengonçado.

Tão descompassado quanto a direção, ainda incipiente, de Nelson Pereira. No filme vemos a impossibilidade, ainda , de se falar de temas profundos e metalinguísticos. Nelson, assim como o personagem interpretado por Paulo Goulart, o Moacir, sabe da importância que tem a cultura da Zona Norte do Rio. Mas não chega muito perto dela - vive na procura pela erudição em composições.

Com a distância entre o morro e a burguesia se edificou coisas belíssimas como a própria bossa nova, citada no filme, e o cinema novo. Mas este aspecto do cinema que se criava foi criticado, e revisado por Glauber, em sua reinvenção da linguagem cinematográfica - em sua volta às primeiras imagens do Brasil. Nelson Pereira ainda se deslumbrava com os estilos misturados, a ingenuidade do multiculturalismo que distancia as diferenças, e deixa cada um em seu lugar de nascença.

Essa distância entre o morro e os prédios da Zona Sul não mataram só espírito - matam hoje em uma guerra civil encoberta. E, sinceramente, não acho que qualquer comissário da ONU, como o atual Luis Varesi, tem o poder de mudar o que se instalou na sociedade, e na cultura brasileira. Nelson Pereira, talvez, quem sabe... mas ele acabou de entrar para a academia brasileira de letras.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Memória, de Apichatpong Weeraserhakul

  Uma coisa é certa em filmes de Apichatpong: você não se vê no tempo unicamente cronológico. Esse tempo-outro, mais relatado pela indistinção entre o que chamamos de passado, presente ou futuro, nos coloca em um questionamento direto sobre nossa presença no mundo atual. Memória, seu novo tratado (insisto em não chamar apenas de filme uma tese contínua), procura nos evidenciar aquela indistinção. Mas o tempo indistinto, na memória de uma colonizadora - vivida por Tilda Swinton -, mente o tempo todo. Se realiza na ficção, numa espécie de loucura. Por que isso se mostra dessa maneira? Provavelmente porque a racionalidade, o “colocar tudo nos eixos” é alguma coisa muito pouco elucidativa. Esse uso do racional para mostrar o que queremos, ou o que parece ser o “real” já se encontra há muito tempo em crise. Na memória, nós vemos uma profunda escavação arqueológica. Ela nos coloca em questão, como pessoas viventes em uma narração ocidental. Essa memória é capaz de unir a Tailândia com a ...

Guerra Conjugal - Joaquim Pedro de Andrade - 1975

Joaquim Pedro teve sempre que ser muito tímido para que sua imposição artística não tivesse presença autoral , como no amigo que ele sempre admirou, Glauber. Em uma comédia de costumes da classe média brasileira, só reatando as pazes com Nelson Rodrigues, mas ao jeito de Dalton Trevisan - exagerando no pessimismo, domesticando os planos em uma falta de sincronia entre o mundo velho e o mundo novo. Não só Joaquim Pedro seguiu, trilhou, abriu esse caminho no cinema novo, mas principalmente Arnaldo Jabôr, onde o drama de costumes chegou a seu ápice em uma agudez sátira. A briga é com o uso do melodrama com fins absolutos de mercado, e com o sentimento carioca meio bobo, de que há romantismo de folhetim em vida. O brega forte desse popular exagerado demonstra o que o avanço econômico nos proporciona, na mídia. Nesse ambiente de cultura de massa dominante surge o filme Guerra Conjugal, de Joaquim Pedro. A mediocridade e decadência chegam a doer de tanta verossimilhança, nesse filme. É um re...

Don't Look Up - Não olhe pra cima (2021)

Quem não gostou do filme, em particular da história do filme - do enredo -, é um negacionista. Disso não resta mais nenhuma dúvida. Mas, qual será a ordem desse negacionismo que nos cerca? Esse Bolsonaro-trumpismo influente e tão ameaçador que faria, nessa historinha de filme cômico, as democracias e os próprios democratas (se é que há democratas reais no filme) aderirem ao fim do mundo? Sim, se você não percebeu ainda, os negacionistas pretendem o fim do mundo. Seja de um mundo esférico, por uma defesa do mundo plano, seja de um mundo pleno (com E) e vivido pelas multiplicidades de pessoas diferentes. Esses negacionistas que nos atordoam a toda hora na internet, e que um dia foram chamados de HATERS, hoje estão nas famílias mais democráticas de nossas Américas, são negadores tal como aquela negatividade hegeliana que se travestiu ao longo dos tempos com a terminologia "crítica". Está, portanto, aberta a porta dos infernos, a chamada caixa de Pandora, um baú da infelicidade, ...