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Mostrando postagens de julho, 2007

Homenagem a Igmar Bergman

Sommaren med Monika (1953) Mais um filme que a tradução não consegue captar em sua falta de consistência avaliativa. Bergman certamente não era um daqueles cineastas que fechava seus filmes em adjetivos, qualidades pessoais - ele não achava seus personagens, deixava-os viver por si. O filme chega no Brasil com o nome de " O desejo de Mônica ". Mas não é pior que o título em inglês: Summer With Monika - The story of a bad girl. O verão com Mônika fica então já classificado como a história de uma moça diferente, difícil, má, a principal. Mas quem vê o filme percebe que esses títulos são apenas mais uma das coisas infantis e bobas da indústria cinematográfica - entidade suprema das idiotices. Mônika é uma personagem que nos cativa em sua ingenuidade, e, porque não, seu poder é feminista. Em 1953 um nu cinematográfico causava muito furor dos mais tradicionalistas. Em uma "história de amor" como nesse filme, era perdoado. Aliás, é difícil encarar com tanta precisão, na f

Dong - Tsai Ming-Liang - 1998

As formas possuem almas, e já haviam dito isso bem antes de qualquer teoria ocidental marxista lukacsiana. A alma está não só no animismo, nem só em um imanentismo - como se as paredes quadradas e as coisas retas fossem algo por si, e com sua própria "subjetividade". Não é assim, e vemos isso nos filmes de Tsai Ming-Liang. Lá os apartamentos, cubículos de Taiwan são continuidades do corpo dos personagens. Em The Hole o todo se vê nas partes, e o contrário também. A perfeição com que o diretor nos passa a angústia de uma vida moderna absolutamente incapaz de se sustentar em suas estruturas é incrível. É algo que há muito tempo não se via no cinema - arte-ciência moderna por excelência. O mesmo cinema que adora mostrar danças e músicas para confortar as platéias decadentes é também o que mostra o fim dos tempos na degradação dos ideais pregados pela TV. A mesma TV que publiciza os avanços é a que divulga novos vírus e epidemias. O universo criado por Ming-Liang é aterrorizante

Hair - Milos Forman - 1979

Outro musical que a broadway consegue dar seu brilho mundial. Esse tipo de espetáculo ultrapassa as limitações de crises que sempre retornam à sociedade de consumo. O próprio gênero musical era constantemente atrelado ao período de recessão dos EUA - a depressão da década de 30. Bem, o que vemos em Hair é uma adaptação lúdica do clima flower power da década de 60. Milos Forman , um diretor vindo do leste europeu meio comunista, tem seu precurso filmográfico marcado por uma não consideração aos temas amenos. Ele, em Hair , não deixa ninguém ileso, na verdade. Um filme cético, porém nostalgico. A liberdade que um passado bem próximo exalava, mesmo com a guerra do Vietnã, era inigualável. É bom ressaltar que quando o filme foi feito muitos dos hippies eram já chamados de yuppies. Havia já um clima de desespero que daria o ar de toda a década de 80. Hair não é uma ópera, como se configura em Jesus Christ Super Star, mas um musical que também chega à discussão social da postura revolucionár

Jesus Christ Super Star - Norman Jewison - 1973

Essa ópera-rock teve início em um livro, do inglês Tim Rice , chegou ao cinema e logo após ganhou a brodway em espetáculos voluptuosos em orçamento. Gastam , talvez, mais que 100 vezes a paixão de cristo que acontece em nova jerusalém, em Pernambuco. A propósito, estamos falando do grande espetáculo da mídia - e de como o Jesus Cristo ganhou o status de superstar. O filme é uma obra prima do espetáculo midiático. A crítica a ele próprio fica evidente no momento do distanciamento de quem vê o filme com o que ele quer nos fazer identificar. Como nas tragédias gregas - a citação é direta pela locação de filmagens, as ruínas da grécia antiga, todos cantam para os que esperam a moral do filme. A música também é de um inglês, Andrew Lloyd Webber , já conhecido por outros musicais anteriores - e sempre subversivos. O destaque fica pra Judas , o tentado pelo demônio que conhece mais de Cristo que qualquer pessoa - inclusive o enviado por Deus. Cristo, um hippie nas entrelinhas, é levado por u

Mom & Dad - Fabien Leroy

De um super 8 da família o diretor, ainda desconhecido por mim, nos contextualiza. Imagens familiares nos remetem ao drama, mesmo em documantários. Mas não é um documentário. Não é nem sequer um filme. Alguns podem até querer classificar como um videoclipe da banda Young Marble Giants - mas não é oficial. A música, a propósito, aparece como um dos parâmetros que evocam o passado, o início dos anos 80. Estamos no mar, em plena liberdade e inocência juvenil, infantil. Como lidamos com uma memória já distante, colocamos as imagens em seu devido lugar de representantes de um tempo. No pequeno filme (que vocês podem ver clicando ali no play) o tempo é do próprio diretor que nos chama como amigos para relembrar junto a ele essa ingenuidade. Tão perto chegamos da vida do autor que esquecemos quem somos por alguns momentos. Chegamos a nos perguntar se o tempo existe mesmo, pois as imagens parecem falsas na movimentação manipulada. Assim existe a mídia audiovisual - na manipulação, que caímos

Trouble Every Day - Claire Denis - 2001

A exposição de tempos diferentes em frente à câmera nos deixa ou perplexos, ou admirados. Essa última opção, a contemplação das coisas, desde a busca pela fotogenia de Jean Epstein o cinema adotou como parâmetro. Não é só um critério para um belo filme, mas para uma boa sugestão para movimentar a vida. Alguns cineastas captam uma beleza contemporânea na violência. Não é o caso de Claire Denis. Mesmo a temática sendo, talvez, a violência e perversão atual, a diretora veste essa digressão com cuidado. Não se trata só dela ser sensível, ter sensibilidade nos cortes e nas cores. Trata-se de levar ao écran uma dose pequena de uma realidade que pulsa, mas ninguém quer perceber. Ninguém percebe porque vivemos num mar de rosas infantil, no qual a mídia impera com imagens bonitinhas e ritmos de parque de diversão. Na qual a força maior é fazer rir das palhaçadas, ou dos absurdos do espetáculo, show de nossos aproximadamente 80 anos de vida. Lembremos de um Alfred Jarry, um dos mais esquisitos

Little Miss Sunshine - Jonathan Dayton e Valerie Faris - 2006

Como aqueles filmes que víamos na sessão da tarde, com Chevy Chase querendo ir ao parque de diversões, ou em viagens para outros países com sua família a qualquer custo, aparece Little Miss Sunshine. Parece até mesmo um filme desse gênero - "viagens absurdas". A lembrança não é por acaso, o filme é uma citação do férias frustradas do início ao fim. Claro que o filme é narrado de uma forma diferente, mais cheia de imagens e brincadeiras clowns. O absurdo beira o patético, algumas vezes. O desenho animado e os quadrinhos chegam ao cinema de maneira totalizante - não só Tex Avery deu os trejeitos aos atores, mas toda a estereotipação dos atores em comédias de hoje em dia. Mas é assim que a já tradicional família norte americana se mostra ao mundo desde a década de 70 e 80, nas comédias. Certo é que a mudança do humor mais recatado e sutil para um mais exagerado a la desenho animado faz com que o filme perca certos méritos, quando comparado às "Férias Frustradas" que

Gloria - John Cassavetes - 1980

Pra tentar responder à provocação feita por um(a) anônimo(a) no post passado, chega a Gena Rowlands no filme do J ohn Cassavetes . Glória não é um filme tão inovador quanto Husbands, ou até Faces - mas não aceita de maneira alguma fórmulas pré-estabelecidas. A heroína, Glória , é uma mulher normal, de classe média americana, que se vê perseguida por pessoas desconhecidas. Num universo realista as ações são fantásticas. Em um momento Glória derruba dois carros dando tiros - e o exagero não parece inverossímil. E, como sempre nos filmes de Cassavetes pai, há a presença dos oprimidos na tentativa de redenção. Um filme feminista. Tal como surgiam na década de 70; tal como vemos em Kill Bill , em Jackie Brown , em Maria Antonieta , em Volver - filmes atuais. Glória é um ótimo parâmetro para filmes de ação, afinal de contas, em Cassavetes o mais importante não é o movimento via uma finalidade, mas a completude do momento sendo tateado pela câmera. É um filme emotivo, e por isso feminino. Syd

Alpha Dog -Nick Cassavetes - 2006

Diz-se no filme que é uma história verídica. As inserções pseudo-documentais com os atores do filme contando o acontecido no início e ao fim do filme, com um depoimento que se destaca da atriz Sharon Stone - completamente diferente, dão esse tom. Estaríamos vendo uma reconstituição, portanto. Nessa reconstituição, os atores não convencem. Afinal de contas, são somente atores adolescentes brincando de cinema, e de ser adultos. Exatamente como nos seriados pra TV. Estamos vendo ao que aqui no Brasil equivaleria a um teste para futuros papeis na indústria, o Malhação, da rede globo. Vide o superestimado Justin Timberlake, que é bom ator, bom fantoche, mas brilha muito pra pouca aura. Espanta a riqueza do filme. Falo da riqueza do lugar, das casas, das pessoas, dos carros, a riqueza material mesmo. No quesito narrativo ele tenta inovar, mas deixa a desejar. A mensagem moralista do filme passa despercebida. Apesar disso vemos que Nick Cassavetes é bom diretor, é esforçado. Até parece brinc

Ironweed - Hector Babenco - 1987

Miséria não existe somente no Brasil. Tem na Argentina e nos EUA também e Hector Babenco sabia, e sabe disso - vemos ele usar dela pra fazer seus filmes. Os feitos lá nos EUA são meio desencontrados. Como Ironweed, que não sabe se é um filme clássico ou meio moderno. Mas ainda sim é muito interessante. Muito desse "interessante" é pelo elenco. Além da dupla principal, Jack e Merryl, vemos o músico Tom Waits, como Rudy. Os personagens são fortes, bem caracterizados, e o filme deve muito ao teatro por isso. São cenas praticamente inteiras feitas como em um tablado. Algumas adoráveis, como a srta. Streep cantando em um bar. Uma adição daquela fantasia que só um latino americano poderia ter na cabeça, na esquizofrenia que nossa miséria provoca - visão de mortos, uma nostalgia por um passado próspero, a elegia da bebida e da comunidade contra a família conservadora. Esta, por sinal, muito presente na história. Por fim, acabamos vendo um belo recado aos Estados Unidos - e talvez p

The Tenant ( Le Locataire) - Roman Polanski - 1976

Algumas observações bem básicas sobre esse filme de Polanski. O Inquilino tem o próprio diretor como ator principal. É talvez um dos melhores filmes para se ilustrar a discussão do EU, sob a perspectiva mais contemporânea - que muito deve à psicanálise lacaniana. A história se passa na França, mas é todo falado em inglês. No fundo Polanski faz uma crítica pesada ao país - a França preconceituosa. Aquele prédio serve como alegoria da nação mais tradicional. Em outro fundo ele também mostra como essa França tradicional é muito mais forte que qualquer levante jovem da década passada, que os deixa sem opção a não ser a loucura. Com sua narração clássica, mas lembrando o teatro do absurdo, o diretor deixa seu filme mais polêmico, mais cheio de espinhos para o eterno espectador inerte. Em "O Inquilino" Roman Polanski ultrapassa sua autoralidade já conhecida. O filme não é só um suspense como Repulsion, ou Rosemary Baby. Outras nuances mais políticas aparecem para dar atmosfera ao f