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Mostrando postagens de fevereiro, 2008

Porto das Caixas - Paulo César Saraceni - 1962

Junte os seguintes nomes: fotografia de Mário Carneiro, trilha sonora de Antônio Carlos Jobim, roteiro adaptado de Lúcio Cardoso, atuação de Reginaldo Farias, direção de Paulo César Saraceni. Será que a obra poderia sair razoável, com tanto peso junto? Sim - saiu. Talvez porque Saraceni ainda não tinha a habilidade necessária para contradizer a linha do cinema traidicional no Brasil. São falsos raccords e quebras de eixo em demasia, são notas repetidas demais do Tom, ao passo que são fotografias lindíssimas de Mário - não se via tanta beleza até então no cinema brasileiro. Inclusive, nem se podia saber quanta beleza tinha esses dramas brasileiros. Lembra, também, Sven Nykvist, o segundo diretor dos filmes de Bergman. Mas o filme sinceramente deixa a desejar em seu ritmo monótono, sem maiores surpresas. Uma moça do interior, mora na casa de um marido rude, e procura, através de seu charme, sedução, um rapaz para matá-lo. Ela tem discussões que parecem não querer acabar com este marido -

Jogo de Cena - Eduardo Coutinho - 2007

Essa é a proposta do cinema contemporâneo - pelo menos daqueles que vão mais à frente: dedicar-se ao questionamento do que se diz ser a realidade, e a invenção. Problemas psicanalíticos, imaginários, públicos ou privados à parte, o que Eduardo Coutinho vem fazendo nos seus últimos filmes é algo que ultrapassa esses dilemas. Isso porque, como sabemos, o diretor desaba em discussões éticas em documentários. É melhor dizer que ele faz filmes, e não documentários, portanto. Muito mais agora, que suas "regras" foram quebradas. "Nunca montar de maneira ilusória; não colocarás voz over em cenas distintas; nunca inventará ficções para enganar o público - não sejeis Michael Moore!" Coutinho crítico da invenção, da imaginação no filme agora cria. Mas suas crias, suas criações ficam, ainda, na captação do momento. Ele quer, no fundo, deixar toda a discussão um pouco de lado, e aproveitar o ensejo de atrizes contratadas para tentar captar melhor aquilo que sempre tentou gravar.

Annie Hall - Noivo neurótico, noiva nervosa - Woody Allen - 1977

O problema que Woody Allen tem ao não conseguir distinguir a realidade da ficção, algo que Brecht, se estivesse vivo, elogiaria, é o que faz uma grande parcela da platéia no cinema deixar de querer assistir aos dramas existenciais bergmanianos do diretor judeu novaiorquino. Mas a coisa é que esse problema é a chave de Allen - se não dá pra aceitar esse contrato, deixe ele de lado mesmo. A distância entre o que é contado e o que é visto é manifesto em Annie Hall. Essa distância começa logo quando ele, o diretor, também personagem no filme com o nome de Alvy Singer, surge no início da película contando sua história de vida no Brooklyn. Antes mesmo de conhecer Diane Keaton, aquela que seria o grande amor da história. Ele conta, narra, mas participa da trama - a distância serve ao humor, e a polêmica da alienação da imagem do espectador pelo cinema fica pra um plano mais inconsciente. Allen é Alvy, e o contrário pode ser também. O personagem, ou a vida do comediante ficcional, é confundi

Le Lit de la Vierge - Philippe Garrel - 1969

O salvador é personagem de alguns filmes nas décadas de 60 e 70. Podemos lembrar, inclusive, de uma pelícua feita por Glauber Rocha , na Espanha, chamado Cabezas Cortadas. Uma ceifa, arma do salvador, junto aos guerrilheiros surgem das montanhas rochosas à procura do rei Diaz - do conhecido país Eldourado. Só que este filme vem logo após uma reflexão de Phillipe Garrel , em Le lit de la Vierge. Nele, Garrel põe no onírico revolucionário uma melancolia que chega ao fastio - não há salvação certa no leito da virgem. Nem mesmo Maria Madalena, que guarda o que um dia atiraram em seu corpo, consegue livrar Cristo dessa depressão. Mesmo lembrando um pouco o show de Jesus Cristo Super Star, com as músicas conhecidas da conturbação norte-americana e inglesa da década de 60, o horizonte fica na nulidade. Cristo carrega algo que poderia ser a caixa de Pandora. O inferno. Em uma caixa pequena e leve, como uma mala. O que mais nos alucina é a perseguição interminável de cães e policiais modernos

Novo Espetáculo

Será este o primeiro norte-americano afro-descendente a chegar ao cargo mais alto do mundo? Ao cúmulo, centro do império? Àquela cadeira que já serviu de andaime pra dias de preguiça e fadiga de George W. Bush pai e filho? Tomara. O belo e sagaz John Edwards saiu da frente - agora, no partido democrata, temos a mulher de Clinton, Hillary, e o negro Barack Obama na disputa. Seria um fato histórico para o espetáculo político pós-moderno. Daria fôlego aos movimentos negros. E talvez, se Barack chegasse (chegar) ao trono, teríamos como ver a política internacional desse, que talvez, seja o mais querido presidente, desde Kennedy. Ao mesmo tempo, também o mais visado por miras de milícias armadas conservadoras da própria nação estadosunidense.

A morte e Glauber Rocha

Serge Daney « Genial e incómodo; o mais conhecido – e é sem dúvida o maior – dos cineastas brasileiros estava um pouco esquecido. Cinema novo, tropicalismo, tricontinentalismo estão longe? Ele, Glauber Rocha, não esquecia nada. A última vez que vi Glauber Rocha foi nos escritórios dos Cahiers du cinéma , perto da Bastilha. Não o conhecia, mas tinha visto os seus filmes dez anos antes. Já ninguém falava dele, excepto para dizer que tinha ficado louco ou que se tinha comprometido com o regime militar brasileiro. Tinha vindo a França mostrar, quase em bicos de pés, o seu último filme, um filme a que tinha dedicado bastante tempo, dinheiro e trabalho e que tinha deixado os festivaleiros de Veneza pelo menos perplexos. Esse chamava-se A idade da terra e não se parecia a nada de conhecido. Um filme torrencial e alucinado. Um Ovni fílmico, nem mais, nem menos. Glauber estava em Paris para tentar distribuir o seu filme, reatar alianças, fazer o ponto da situação. Falava muito, delirava certa

Conversa: Jean-Luc Godard/Serge Daney

(a propósito das História(s) do Cinema) Godard e Daney falando sobre as histórias do cinema. Dois olhares semelhantes sobre a situação do cinema, mesmo objeto de estudo: o cinema enquanto "histórico". Em momentos, entretanto, parece que os dois falam línguas diferentes, que desenvolvem seu pensamento paralelamente, com pequenas bifurcações apenas. Estilo um pouco estranho, mas que dá uma idéia da dimensão do pensmento contemporâneo sobre o cinema e sua história. Serge Daney: Você faz a história do cinema no momento em que está claro para você que essa pesquisa não se realizou, ou que ela acabou, e que os ensinamentos que ela poderia ter sobre a vida das pessoas, dos povos, das culturas não foram absorvidos. Quando você era mais didático, quando você acreditava na transmissão das coisas, de maneira mais militante, eu me dizia que você tentava sempre reconduzir as ex

Violência no cinema I

Thomas Alva Edison contrariou a todos os franceses, como os irmãos Lumiére, que desacreditavam dessa brincadeira de vaudeviiles - assim inicia-se a morte do ser humano do século XIX. A morte espiritual, claro. Porque se antes dos arco-íris que trariam nossa redenção perante os mais pessimistas românticos idealistas, e demais adjetivos pejorativos da época que se passava, existiam as sombras da comunidade antiga, clássica e pré-moderna ali como um espectro ético sustentanto o passado em moldes futuristas. Primeiro foram as metrópoles. Grandes construções, grandes máquinas, grandes desafios para o novo milênio, grandiosidades, imensidades, e insegurança. Esta era profundamente democrática - todos deviam tê-la, todos deveriam usufruir dessa multidão ameaçadora, da criminalidade e violência que beirava o absurdo do apocalipse dos novos tempos. Carros substituem as charretes, e a eletricidade as velas e lampiões. O universo arcaico se extinguia, junto a seu encantamento. As novidades vinham