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Mostrando postagens de outubro, 2010

::algo sobre a reclamação::

Ao que parece, e todos sabem disso mas não saem por aí dizendo, o Novo Mundo ainda sofre com algo da herança colonial. Por quê? Porque aqui, principalmente no Sul, a chamada sudamérica, dizem pelos cantos a frase "se a gente reclamar não dá jeito" - ou pior: "não adianta reclamar"; "se reclamarmos de tudo vamos viver reclamando", fazendo mal apenas a nós mesmos, ao nosso estômago. Não acredito que nada aqui seja "natural". Naturais são as florestas paradisíacas, não a maneira de se atuar em sociedade. O que me parece é que aqui querem mais viver felizes, se possível em festas que vão das micaretas às farras dos peões - e isso vale para a américa do norte também, que tem a melhor e mais inventiva música do mundo, o rock n´roll por eles criado. O Novo Mundo vive festejando a vida, por novas perspectivas de uma multiculturalidade do futuro, da construção de um "novo milênio", novas vias, novidades levadas ao mundo inteiro. Mas nós aqui no

Um filme que beirou a política: Bem Amado - Guel Arraes - 2010

Quando o filme Bem Amado termina, vemos o nome Brasil transmutar-se em Sucupira . Isso acontece por razões claras de uma tentativa de se fazer política nesse andamento indeterminado da arte cinematográfica contemporânea. Guel Arraes, diretor do filme, filho de político conhecido pelo exílio, de Pernambuco, que trabalha na Rede Globo desde a década de 80, assume diretamente o tema político – e finalmente - , mas com certeza meio tarde. Indeterminação também na tentativa de um diagnóstico usando a tardia alegoria do dramaturgo Dias Gomes, em tempos que tudo fica claro quando é dito “na cara”, e não em adornamentos e mensagens escondidas e distorcidas. Nada contra a alegoria, pelo contrário. O problema fica em seu manejo. Digamos que, o ator Marco Nanini, que trabalha com Guel no seriado A Grande Família, e é relembrado como o matador de “Lisbela e o Prisioneiro”, chama o filme para si. Mais que, à época, Paulo Gracindo. Odorico Paraguaçu, o prefeito coronel, político-mor da província

Nome Próprio - Murilo Salles (2008)

Existe no Brasil uma tribo imensa de anglófonos em arte que se auto-intitulam independentes. São músicos, escritores, artistas plásticos e cineastas que às vezes conseguem pensar em inglês, e dizer algo que nem jamaicanos, nem australianos, nem nigerianos, nem mesmo norte americanos conseguem entender. Inglês, aliás, é a língua corrente nos undergrounds da vida global. Neste nicho pode se enquadrar Clarah Averbuck, escritora que admite um pop, deseja o espírito de Andy Warhol, misturando com John Fante, o velho Hank, a escritura Gonzo, e, quem sabe, a mística beat de Jack Kerouac. Baseado em coisas que Clarah escreveu em blogs, e em seus dois livros publicados, e algo do que ela andou falando pelos bares, o filme Nome Próprio torna evidente essa cultura vaga, esfumada, indie , do pop tupiniquim (e não tupinambá). A batida, o ritmo é da modernidade tardia. Uma modernidade antiga, que tem ar retrô. Não haveria espaços melhores para serem gravados que não fossem os degradados condo

Espíritos no cinema

Milhares de pagantes de uma indústria que se consolida aos trancos no Brasil Certo dia um colega estudioso de cinema na Índia me explicou em parte o fenômeno da indústria de filmes em Bombaim, a Bollywood. Esta é, para os que desconhecem do fato, a primeira maior indústria de filmes em número de audiência do mundo. Ele dizia que além do drama familiar, a busca dos espectadores era por algumas narrativas que tocassem no tema da religiosidade hindu. São mais de 1 milhão de deuses, semideuses, ancestrais, no hinduísmo – personagens não faltam. Chegam, alguns das castas mais pobres do país, a jogar moedinhas para a tela e gritar nas salas, como num culto, num ritual, numa festa religiosa. Bem, fato é que os realizadores atuais no Brasil tocam no tema do espiritismo em algumas obras. Tema que, aliás, merece maior atenção – e, com a permissão do jornal, voltarei a tocar com mais apuro posteriormente. Em 2008 um filme pretensioso em produção, do Ceará, consegue mais de 400 mil pagantes em s

The Misfits - (1961) - John Huston

- Marlyn Monroe, uma mulher absurdamente linda, cativante, carismática, alegre, sensual, vai ao interior para processar o ex-marido por violência. Ganha. Conhece dois rapazes durante sua estada na cidade: um ex-combatente de guerra e um cowboy. Este último, Clark Gable, aquele de E o vento levou... - Se o realismo não era, antes, um atributo de filmes hollywoodianos, este é uma exceção a essa regra. Em medidas bem ajustadas, óbvio, pois ninguém iria aos cinemas lotar sessões e comer pipocas se não houvesse o chamativo do showbusiness. Marlyn e Montgomery Clift são estes chamativos do star system. No entanto, longos planos sequências nos dão um sabor novo de modernidade em meio a toda a ostentação interiorana da cenografia. - Detalhe importante, agora. A crítica que John Huston faz, como sempre, à ambição humana diante da natureza. Ambição, diga-se de passagem, patriota, símbolo maior do capitalismo moderno no mundo. O cinema, aliás, era divulgador dessa simbologia. Não Huston, com este

Uma noite em 67

Sintetizando, numa entrevista, algo de uma memória sempre vem à tona quando quem está no ponto dianteiro das perguntas é alguém que viveu tais lembranças. Aí vem uma história quase perfeita que é compartilhada, comemorada, comentada, vista com comoção, elevada ao típico patamar de sombras empoeiradas e guardadas em prateleiras, que nos assombram no passado. Em uma época de atritos entre uma grande parcela da juventude mundial que tomava o poder das mídias, e uma tradição cheia de teias de aranhas – como foi o final da década de 60 -, os lugares desconhecidos de uma cultura revolucionariam um Brasil tão positivista e tão integralista, senhorial, conservador. Falamos do III Festival de Música Popular Brasileira da TV Record, que aconteceu em 1967, e deixou em arquivos atuais momentos singulares das movimentações culturais que viriam logo após essa data. Caso da estréia de Caetano Veloso com a música Alegria, Alegria; ou de uma invenção intelectual e estética de Chico Buarque, com Roda

Silêncio no cinema – Pedro Costa e a preocupada maneira de se inventar

Parece que sobre cinema não se fala – só se assiste. Escrever sobre cinema é coisa de gente que se mete a decodificar socialmente aquilo que no ecrã (tela) se expressa. Pois, na cinemateca portuguesa não há biblioteca tão farta, tanto quanto a cinemateca de São Paulo, por exemplo. Mas está, assim dizem, a maior coleção de filmes da Europa, ganhando inclusive da França, país da crítica, dos cahiers. E, convenhamos, não é em toda cidade que há museus de imagem e som. Neste lugar da falta de textos sobre uma cinematografia, está um dos mais controversos, polêmicos (e nem por isso pouco assistido) cineastas portugueses: Pedro Costa. Este dá as costas a qualquer tipo de cinema comumente aceito. É, segundo alguns, discípulo de António Reis, um grande teórico da imagem, perfeito em sua pesquisa e precisão técnica – à maneira de Jean-Marie Straub. Mas assim, antes de teorizar, para eles há o imaginar! Provocações súbitas à parte, tanto António Reis quanto Pedro Costa imaginam muito mais com o
A pose Furtei de um outro blog essa fotografia. Queria falar um pouco sobre a pose. O posar em fotos pode-se remeter ao posar para pinturas. Durante muitos séculos o trabalho artístico se valeu do posar por alguns motivos práticos e técnicos, já que só com a fotografia o instantâneo veio a ser captado pela técnica. Antes, desde as Madonnas de Da Vinci, os quadros de Caravaggio - cenas inteiras enquadradas, até os devaneios de um pintor mais próximo a uma abstração, como Van Gogh, eram representados de uma pose quase divina. Isso porque a arte possuía uma aura da eternidade, própria do medievo composto pelas regras estatais cristãs, religiosas e, por isso, sociais. A arte era quase toda posada, mesmo quando as cenas pintadas não eram imitações de uma pose. Veio a fotografia, finalmente, nosso mundo moderno, e nossa espontaneidade anti-duração. Se para o homem comum medieval ficar umas oito horas parado diante de um pintor não era algo recusável - afinal havia pagamento pra isso -, hoje,