Pular para o conteúdo principal

A Última Floresta - Luis Bolognesi e Davi Kopenawa

A imersão de Bolognesi nos temas indígenas, em seus últimos filmes, demonstra que quando o cinema dá atenção a isso, algo se revela. Parece ser um caminho sem volta. Uma estrada sem fim. Mostrar, em imagem, os temas indígenas, tem força de revelação, sim - mas também de reativação com discussões antigas.

O que faz aquele que se chama de "indígena" um caso particular. Não se fala de uma humanidade, de um humanismo nos termos que antes das colonizações de falou. Estamos diante de uma questão, um dia chamada "indígena". Estamos diante, portanto, de algumas questões que envolvem afetos e sentimentos que nos forjam como pessoas ligadas ao subjetivo indiretamente violentado e assassinado pelo contato interétnico das interiorizações do país.

Davi Kopenawa tem sido um dos maiores lutadores, desde os conflitos com garimpeiros nos tempos de Serra Pelada, e também, como não dizer, na briga que ainda se vale de gritos e falsas informações sobre as terras yanomami entre Roraima e a Venezuela - a chamada Terra Indígena de Raposa Serra do Sol.

Nas lutas indígenas, estão estes nomes como Davi e Raoni. Existem filmes em que eles protagonizam a nova questão colonizadora. Estão, em todos, tentando mostrar às plateias do mundo inteiro que algo muito parecido com a questão Palestina ocorre no Brasil. Já se poderia confrontar isso em Godard, Gorin e Miéville, Ici et Ailleurs (1976), longe do que o próprio filme (e somente ele) poderia nos acrescentar. 

Seria insensato não encarar a questão indígena no país com mais atenção. Mais politização. A sorte, ou azar, nos leva a constatar que em tentativas de ficção, falseamento do que realmente anda acontecendo pela floresta Amazônica acabam por deixar o tema em uma teatralização do irrealizável. Ao mesmo tempo que se entende a tentativa de se criar a paz necessária para uma vida mais idílica, sabemos ao fundo que o grande motor de uma modernidade que invade a floresta é a morte, o terror, o assassinato, a transformação de toda a riqueza natural (e aí está também a vida de todos(as) os(as) que vivem por lá) em mercadoria, ou , nada relevante.

Em resumo, Kopenawa tenta nos alertar para isso. Em uma dança narrativa, entre sua singularidade e a do diretor paulistano, as forças criadoras são abafadas e expressadas num retrair-expandir muito próprio à criação em dupla. Deve-se comparar, talvez, o filme em questão com Xapiri. Os espíritos da floresta não estão em relação direta com a nossa corporeidade. É daí que, provavelmente no regime da abstração, que conseguimos retirar algo de mais potente em ficção sobre os yanomami.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Don't Look Up - Não olhe pra cima (2021)

Quem não gostou do filme, em particular da história do filme - do enredo -, é um negacionista. Disso não resta mais nenhuma dúvida. Mas, qual será a ordem desse negacionismo que nos cerca? Esse Bolsonaro-trumpismo influente e tão ameaçador que faria, nessa historinha de filme cômico, as democracias e os próprios democratas (se é que há democratas reais no filme) aderirem ao fim do mundo? Sim, se você não percebeu ainda, os negacionistas pretendem o fim do mundo. Seja de um mundo esférico, por uma defesa do mundo plano, seja de um mundo pleno (com E) e vivido pelas multiplicidades de pessoas diferentes. Esses negacionistas que nos atordoam a toda hora na internet, e que um dia foram chamados de HATERS, hoje estão nas famílias mais democráticas de nossas Américas, são negadores tal como aquela negatividade hegeliana que se travestiu ao longo dos tempos com a terminologia "crítica". Está, portanto, aberta a porta dos infernos, a chamada caixa de Pandora, um baú da infelicidade, ...

Memória, de Apichatpong Weeraserhakul

  Uma coisa é certa em filmes de Apichatpong: você não se vê no tempo unicamente cronológico. Esse tempo-outro, mais relatado pela indistinção entre o que chamamos de passado, presente ou futuro, nos coloca em um questionamento direto sobre nossa presença no mundo atual. Memória, seu novo tratado (insisto em não chamar apenas de filme uma tese contínua), procura nos evidenciar aquela indistinção. Mas o tempo indistinto, na memória de uma colonizadora - vivida por Tilda Swinton -, mente o tempo todo. Se realiza na ficção, numa espécie de loucura. Por que isso se mostra dessa maneira? Provavelmente porque a racionalidade, o “colocar tudo nos eixos” é alguma coisa muito pouco elucidativa. Esse uso do racional para mostrar o que queremos, ou o que parece ser o “real” já se encontra há muito tempo em crise. Na memória, nós vemos uma profunda escavação arqueológica. Ela nos coloca em questão, como pessoas viventes em uma narração ocidental. Essa memória é capaz de unir a Tailândia com a ...