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Maio de 68 passou desapercebido – para aqueles que voam na vida



Violência assola França

Paris está com suas ruas limpas. Pelo menos isso é o que o Governo de Jaques Chirrac andava querendo mostrar para o mundo – a limpeza da França. Agora, com mais de 300 carros, segundo números oficiais, queimados nas ruas, diversos atos de vandalismo a prédios e ginásios públicos e aproximadamente 300 pessoas detidas em uma só noite, essa visão de limpeza não mais convence.

Dois ministros da direita (Villepin e Sarkozy) francesa já pensam em destituir Chirrac. Por que? Digo agora.

A “violência urbana” de “gangs de jovens” de periferia que dominou o país, junto com a quase que “guerra de etnias” que existe desde tempos. A tal “escória” (assim gritam os conservadores) já queimou mais de 5 mil carros em aproximadamente 3 semanas de mobilização, muito mais do que o governo vem divulgando. Em uma só noite do dia 11 de novembro foram 900 carros queimados, inclusive no centro da capital, Paris.
Depois disso, 3 mil homens foram contratados para atuar na polícia. O governo “de esquerda” de Chirrac só se mostra perplexo, e não sabe o que fazer. Determinou então estado de emergência, ou seja, qualquer casa pode ser invadida e revistada pelos policiais a qualquer momento. Só que a força das tais gangs ainda é bem maior que a da polícia do governo.
Vejam: os imigrantes lá não possuem os mesmos direitos de cidadania dos franceses “de sangue” (por exemplo, direito a saúde pública, educação de qualidade, e sofrem discriminação na busca de empregos). Façamos uma analogia com nossa realidade brasileira, na qual um descendente africano ainda mora em quilombos (algumas favelas da Bahia, só pra citar) – mas os negros e mestiços de periferia daqui não queimam nada e nem depredam prédios, segundo a mídia. Alguns expressam sua violência de outra maneira, isso qualquer imbecil de Internet sabe.

Os anarquistas

Conflitos entre imigrantes e a “cidadania” francesa chegou a um clima de aperto absurdo - em cada 8 franceses, hoje, 1 é mulçumano. A reação é imensa ( veja no texto abaixo desse como os americanos vêem a situação). Os policiais, em sua maioria, são brancos e franceses “bem criados”, enquanto que os manifestantes são imigrantes negros, com traços árabes, mestiços. Isso tudo, na verdade, teve início depois do imperialismo mercantilista do século retrasado e passado - a França nesse momento só faz sofrer as conseqüências deste "antigo" colonialismo e da exploração usurenta que praticou nos países Africanos. Não mais vemos aquela França de bons modos, da boa educação, da direita aristocrática de La Bruyere, ou burguesa de Voltaire, ou de Diderot. Muito menos da esquerda de Sartre, de Guy Debord ou de Foucault. Não há nomes nem ícones, porque a "barbárie", o caos sem direcionamento político que comanda os alvos das pedras e coquetéis molotov. O governo, inclusive, chama os jovens violentos de anarquistas. Será assim?

Não temos como, nem o que falar

A mídia, em sua insistente parquice, chama tudo de violência urbana, de jovens depredadores, de gangs de periferia, diz que o governo não consegue manter a ordem, que os policiais foram baleados, que o governo não consegue manter. Os jornais e as Tvs não nos mostram absolutamente nada mais que os relatórios de órgãos públicos franceses.
Posso dizer que a Globo cumpre seu papel de assessora de imprensa da burrice, ao nos informar reiteradamente que “o governo não consegue manter a ordem”, ou “o governo não consegue conter a ação dos manifestantes”.
Ainda não conseguimos entrar nessa notícia que é de extrema importância tanto para uma visão mais de esquerda quanto para alguns conservadores. Para se ter uma idéia do acontecimento – a tal onda de violência (outra palavra de ordem das emissoras de TV e da reuters) existe há muito tempo por lá. Agora a dimensão da notícia tomou proporções mundiais porque o ato de queimar inúmeros carros chama bastante a atenção. Lembra o episódio da queima dos próprios corpos de monges tibetanos que se manifestavam contra a guerra do Vietnã. Só assim a mídia maior percebe a força dos manifestantes contra atitudes governamentais que, no mínimo, são equivocadas.

Os carros que se foram

Há um indício de organização dos grupos de jovens imigrantes da França. Eles andam queimando um dos maiores bens da nossa humanidade privada, que é o automóvel. Imagine você, brasileiro, classe média, ter seu carro queimado à frente de sua casa por habitantes da periferia... Soube de uns aqui no Augusto Franco, bairro aqui de Aracaju... Proponho a você procurar mais informações sobre o que acontece em territórios francos e franceses, para assim poder ENTENDER essa dita organização que citei.
Ela se aproxima da organização de um arrastão na praia de copacabana, por exemplo. Professores universitários, alguns até marxistas, não percebem o poder de mobilização que esse povo completamente excluído possui, apesar de sem rumo – uma força instintiva que os professores só chamam de barbárie, um outro jargão midiático que não dá conta da realidade febril dos sem perspectivas.
Os norte americanos, conservadores, puritanos e mais sagazes nas análises políticas, já conseguiram perceber a possível organização desse movimento. Uma pena os americanos serem tão babões, e tentarem associar essa onda de manifestações ao terrorismo islamico (outro jargão, já que estamos a falar nisso).

Comentários

Anônimo disse…
esse erro não vai passar despercebido...

"Maio de 68 não vai passar desapercebido"

desapercebido: desprevenido, desprovido.

despercebido(o correto): que não foi percebido; desprevenido.
mauro disse…
brigado, daniela... mas fica do jeito que tá.

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