
Depois da revolução? Aqui estamos. Esse depois se define como o momento em que a revolução é nomeada apenas no passado. O que acontecerá e modificará o mundo não acontecerá mais da mesma forma que antes. Nós
viemos depois daquilo que tinha lugar na revolução. No centro, a implosão do gigante soviético. Havíamos lido Alxandre Zinoviev, mas também Mandelstam e Akhmatova. Sem falar de Eisenstein e Vertov, sacrificados ao Império , nem de Barnett nem de Koulechovo, Meyerhold, Babel, Maiakóvski, Khlebnikov, Bakhtin, Chlovski, Tynianv, Eikhenbaum, Propp... Esses, não os perdíamos de vista. A queda da casa vermelha não era, para nós, nem o desaparecimento da Rússia nem o do comunismo. Ainda digo “nós”, essa palavra que me dói. Mas o muro derrubado perturba, a bem dizer, a Europa mais do que a ex-União Soviética. Como Paisá ou Alemanha Ano Zero (Roberto Rossellini) marcaram o surgimento do cinema moderno nas ruínas da Europa destruída pela guerra, um filme marca essa passagem dolorosa, Berlin 10/90 de Robert Kramer, rodado algumas semanas depois da destruição do Muro. Assisti a esse filme muito mais tarde, e bem mais tarde ainda, eu escreveria sobre a brecha que ele abre em cada um de seus espectadores e no corpo do cinema. Cedo demais, tarde demais.
Tempo de fracasso, certamente, político e pessoal. Era realmente preciso constatar não apenas a queda do Muro, mas , antes disso, o desmoronamento da extrema esquerda européia, em Portugal, na França, na Itália, na Alemanha; era preciso enfrentar, ainda e sempre, a questão da luta armada (a palavra “terrorismo” , já onipresente , ainda não era o estandarte negativo das cruzadas do Ocidente), e isso não era, nunca foi simples. Labirinto dos grupos, dos complôs, das manipulações, das suspeitas. Mal saíamos disso e os problemas não acabavam aí. Esgotamento dos combatentes que se dizem, cada vez com menos força, vermelhos e proletários. Jogo de espelhos das causas perdidas.
Jean-Louis Comolli
Ver e Poder – A inocência perdida: cinema, televisão, ficção, documentário
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